Abolição da Escravatura. E o 14 de Maio, o que aconteceu?

*Claudinei Araújo dos Santos


No dia 13 de maio de 1888 a Princesa Isabel assina a Lei Áurea, e declara extinta a escravidão: “A Princesa Imperial Regente, em nome de Sua Majestade o Imperador, o Senhor D. Pedro II, faz saber a todos os súditos do Império que a Assembleia Geral decretou e ela sancionou a lei seguinte:

Art. 1°: É declarada extincta desde a data desta lei a escravidão no Brazil.

Art. 2°: Revogam-se as disposições em contrário.

A necessidade de escrever sobre essa temática traz a relevância de entendermos como o 13 de maio foi importante, para que oficialmente pudesse o Brasil abolir a escravidão, e, promover a idealização da liberdade para o trabalho e a dignidade humana, contudo, de extrema essência devemos procurar saber se mesmo houve o fim das ações escravocratas no país. Costuma-se entre os estudiosos indagar uma real data de significação a liberdade das pessoas negras, uma vez que a escravização de seus antepassados nas terras brasis é marca indelével tendo consequências seríssimas no desenvolvimento socioeconômico do Brasil.

Partindo desse princípio, recomendo a leitura do Historiador Eduardo Martins, “A Invenção da Vadiagem”, em que o autor coloca em tela que essa invenção é justamente para punir aqueles que já eram punidos desde o século XVI ao serem retirados de suas terras, de suas vidas, famílias, reinos, comunidades, colocados em navios negreiros para atravessarem o Atlântico e serem escravizados nas terras brasis. Eduardo Martins, expõe em seu livro a necessidade de estudarmos a transição abolicionista no Brasil e sua real contundência de fatos. É imprescindível salientar que o ato realizado em 13 de maio de 1888, não foi solucionador de um mal histórico, mas, uma maneira de o Brasil se adequar a realidade mundial que se dava desde o início do século XIX, em que, “se tornava proibida a escravização de seres humanos”.

Nesse sentido, é importante colocarmos em referências de leitura dois livros da literatura Brasileira, de Aluízio de Azevedo, “O Mulato” e “O Cortiço”, considerando a criação do termo Mulato, situação pejorativa de relacionar as pessoas mestiças a pouca servidão social, de brancos serem senhores, e, claro pessoas negras serem escravizadas. Não obstante, o segundo livro, nos remete a formação das favelas, uma vez que, com a abolição da escravatura e a Invenção da Lei da Vadiagem, os núcleos urbanos não “eram lugar de negros morarem”, sendo necessitados de encontrarem espaços para residirem e não serem açoitados, violentados, presos, em nome de findar a vadiagem, era assim que o Estado pensava, vadios não deveriam ter vida social, lei que permaneceu até os anos de 1980.

A literatura brasileira é rica historicamente, contudo, há que se exaltar a necessidade da historiografia para melhor entendermos o passado tão presente em nossa realidade. A professora de letras Daniela Diana, relata em um artigo sobre o livro “Capitães de Areia” de Jorge Amado que, esta “é uma obra do escritor baiano Jorge Amado, publicada em 1937. Trata-se de um romance moderno de denúncia social com o tema centrado na miséria dos meninos de rua. O nome do livro faz referência ao bando de meninos, os capitães de areia. Essa o foi censurada pelo governo de Getúlio Vargas e Jorge Amado foi preso durante o período da Ditadura Militar. Por esse motivo, muitos livros (cerca de 1000 exemplares) foram queimados em praça pública na capital baiana: Salvador”.

Ainda de acordo com a Daniela Diana, “Os menores que envolvem a trama vivem na capital baiana, Salvador. Conhecidos como capitães, o grupo reúne cerca de quarenta menores (entre 9 e 16 anos) que vivem num trapiche (velho armazém) abandonado no cais do porto. Grande parte da história acontece no mercado, uma das importantes aglomerações comerciais. Ali, os meninos de rua pediam dinheiro para comer ou roubavam os que passavam. Além disso, eles costumavam caminhar pelo corredor da Vitória, área nobre da cidade de Salvador. Pedro Bala é o líder do grupo, um garoto loiro que possui uma cicatriz no rosto por lutar com o ex-líder: O caboclo Raimundo”. Claro que não ficarei aqui a contar toda a historicidade social do livro, é apenas um ponto de partida para aqueles e aquelas que desejam viajar pela literatura de Jorge Amado. Vale a pena ir a Bahia com auxílio da leitura.

Desta forma, compreendemos que a abolição da escravatura e a invenção da vadiagem, foram fatores preponderantes para a exclusão, discriminação e segregação racial tão determinante na fomentação da pobreza e miséria no Brasil, sobretudo, na solidificação das favelas que temos no país, ou seja, esse processo de marginalização social das pessoas negras, descendentes de seres humanos escravizados, foi idealizado principalmente pelo Branqueamento da População, recomenda-se a leitura de Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda, e essas condição foi se dando especialmente no final do século XIX, enquanto idealizava-se pessoas brancas nos núcleos urbanos, nas terras, na agricultura/monocultura, na política, por outro lado, sustentava-se que em cerca de cem anos o Brasil seria um país livre de pessoas negras, vide que, enquanto o Sul do Brasil recebe alemães, poloneses, italianos, ucranianos, etc, dando a eles terras para o cultivo, as segregações ao povo negro acontece em todas as regiões do país, cabendo-lhes a margem social, ressalto, a formação das favelas, morando em cortiços e quando pego nas cidades, eram levados aos presídios e jogados nas fazendas de ricos políticos/coronéis, no entanto, agora não estavam mais sendo escravizados, mas, sendo penalizados, é “A Invenção da Vadiagem” tão bem escrita por Eduardo Martins.

Já nos aproximando do fim desse simplório artigo, não poderia deixar de citar Gilberto Freyre, com “Casa Grande & Senzala” e ainda “Sobrados e Mocambos”, quando o autor chega a colocar em tela a maldosa democracia racial, é interessante notar que o sociólogo demonstra que negros escravizados e senhores conviviam nas proximidades, a Casa Grande e a Senzala, estavam muito próximas, negros e seus senhores conviviam quase que pacificamente, tendo assim a escravidão brasileira sido branda. Parece algo ingênuo, contudo, esse dilema criado nas conjunturas da academia brasileira, fomentou a idealização do brasileiro cordial, do brasileiro bondoso, amigável, em que, repito, senhores e escravizados conviviam pacificamente, era possível senhor e escravo terem relação muito amistosa, não por acaso o capítulo 04 de Casa Grande & Senzala, nos traz a “Escravidão Afetuosa”, tão comum entre nós brasileiros, patrões e empregados podem negociar, chegamos então a Reforma Trabalhista do ano de 2017, em que os trabalhadores perderam boa parte de seus direitos, naturalização comum nas terras brasis que se acostumou a Maldosa “Democracia Racial”, para que leis, se é possível negociar, patronato e empregado.

Vê-se que, “temos muito passado pela frente”, e estudar a abolição da escravatura, o dia 13 de maio, torna-se imperiosa a dedicação de professores/as, juristas, políticos, médicos, etc, no intuito de corroborar com o processo de erradicação da escravização de pessoas no Brasil, ela ainda é presente, e como diz Silvio de Almeida, ministro dos Direitos Humanos, o ´”racismo é estrutural”, está em nossas estruturas educacionais, econômicas, sociais, e por isso, a Djamila Ribeiro reivindica que, “Não basta não sermos racistas, é preciso ser antirracista”, combatermos as históricas violência praticadas nesse país desde que os primeiros portugueses aqui chegaram em nome da fé, da colonização, da catequização dos povos indígenas e causaram danos contra os povos originários. A literatura brasileira precisa e deve ser historiografada, quanto a sociedade, necessita estudar para fomentar uma nação melhor, capaz de respeitar e causar dignidade humana a todos e todas, não basta não ser escravocrata, é “preciso ser antiescravista”, nosso país é construído por mãos negras, e não é possível admitirmos que o apagamento da história como instrumento de domínio de violência social, construir um novo Brasil.

 

* Doutorando em História pela Universidade Federal da Grande Dourados

Este texto, não reflete, necessariamente, a opinião do Jornal da Nova

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