''Dunkirk'' usa lado B da história para narrar drama real da 2ª Guerra


Sobreviver. Não estamos falando de invadir uma praia, metralhar soldados inimigos e conquistar a sua base. A bandeira estrelada fincada no topo do morro após o objetivo completo, o charuto aceso comemorando mais um dia vivo sob o olhar sanguinário do vigia. A missão aqui é "apenas" uma: permanecer vivo. O coração batendo, os pulmões respirando e a sanidade em dia. Se possível.

Sobreviver, custe o que custar, é o verbo de "Dunkirk", novo filme do diretor Christopher Nolan ("A origem", "O cavaleiro das trevas"). Por um motivo ou outro, ele até pode não se tornar seu favorito do cara. Mas certamente é seu melhor e mais bem executado trabalho. É um mergulho em um acontecimento lado B dos livros de história que narra com nervosa intensidade qual é o drama real da 2ª Guerra Mundial.

Cheirinho de Oscar? Para Nolan, ótimas chances. Já nos prêmios técnicos, a vitória, pelo menos nessa batalha, é quase garantida.

Paciência

"Dunkirk", baseado no livro de mesmo nome, mostra um lado geralmente ignorado dos combates que devastaram o mundo nos anos 1930 e 1940. A Batalha de Dunkirk (ou Dunquerque), uma cidade na França, não aconteceu nas trincheiras. Na verdade, foi o oposto disso.

Apesar de ser considerada uma operação de sucesso, Dunkirk marcou a evacuação histórica de centenas de milhares de soldados aliados que acabaram encurralados pelo exército alemão. Uma derrota que levou à vitória. Mas ainda assim, uma derrota.

A missão durou semanas e é contada em três perspectivas, que acontecem em paralelo:

  • A dos soldados que aguardam o resgate pelo mar na praia de Dunkirk
  • A de uma embarcação de voluntários britânicos que cruza o Canal da Mancha, do Reino Unido à França, para auxiliar na desocupação
  • E a de pilotos da Força Aérea Britânica que lutam no ar para proteger os navios de resgate.

A combinação de muitas narrativas acontecendo ao mesmo tempo é a grande marca de Nolan. Você se lembra, todo mundo xingou muito no Twitter dizendo que não entendeu nada das várias camadas de sono que aparecem em "A origem" – era só prestar atenção? Sim. Mas tudo bem.

Kenneth Branagh, almirante do exército britânico, em cena de 'Dunkirk' - Foto: Divulgação

Em "Dunkirk", porém, o diretor não se contenta em usar suas grandes características (hmmm) como sintomas de um estilo. Aqui, todas elas trabalham ativamente no desenvolvimento da trama e da mensagem do filme.

A fotografia com paisagens enormes e a sonoplastia ensurdecedora, que vai surpreender até mesmo os aficionados pela época, trabalham junto de um silêncio constante na construção de uma brutalidade contra o humano que é, acima de tudo, uma brutalidade emocional.

É preciso ficar claro que apesar de "Dunkirk" ser um filmaço de ação, ele está longe da veia de longas como o recente "Até o último homem", de Mel Gibson. A violência da 2ª Guerra de Nolan não tem banho de sangue, mutilação ou desespero.

Tudo está nas atitudes e na experiência forçada goela abaixo desses cidadãos comuns. É uma guerra dentro da guerra, no caso, pela sobrevivência.

De Bane a ex-One Direction

Os personagens de "Dunkirk" mostram a importância do coletivo contra o indivíduo. Seja no piloto que aceita a falta de combustível para continuar lutando (Tom Hardy de novo silencioso, mas incrível), no veterano que topa partir com o filho em seu barquinho para tentar resgatar um soldado britânico ao menos (Mark Rylance, o trabalhador comum movido por um ideal).

Ou até o soldado qualquer que precisa cometer atrocidades para seguir vivo (Harry Styles, ex-One Direction, em atuação surpreendente boa).

Tom Hardy é um piloto da aviação britânica em 'Dunkirk' - Foto: Divulgação

São poucos, mas precisos, os momentos de respiro. Nolan encadeia sequências de cenas de ação mastodônticas, que mantém o público em tensão permanente e numa confusão extenuante, mas muito emocionante, de medo, pânico, esperança e compaixão.

O apelo humano e dramático é muito forte pois não há glamourização ou heróis muito definidos. "Dunkirk" é a história de um punhado de homens normais, com suas falhas e qualidades, jogados em um evento selvagem que extrapola a racionalidade. E você está ali no meio, acompanhando de camarote, para o bem ou para o mal.

A missão impossível do exército britânico retratada no filme não coloca em jogo a derrota dos alemães. Eles, aliás, com exceção dos caças, não aparecem em nenhum momento de "Dunkirk", permanecendo uma ameaça constante, invisível e extraordinariamente amedrontadora que só intensifica a tensão durante o longa.

Cena de 'Dunkirk', novo filme de Christopher Nolan - Foto: Divulgação

"Dunkirk" tem semelhanças, mas não busca ser "O resgate do soldado Ryan" ou "Atrás da linha vermelha", filmes populares e renomados sobre a 2ª Guerra Mundial. Ele é isso e outras coisas, mas acima de tudo um espetáculo de força bruta.

O filme tem 1 hora e 46 minutos, é compacto, mas acerta como um coice de cavalo. É uma força e tanto. Um coice que é um dos melhores filmes do ano.

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